Família e corpo: formando adultos
Por Leila Cohn, 2019
O corpo da família tem uma organização complexa, um legado trazido há varias gerações, em varias camadas, uma forma própria de funcionar, mas também uma organização corporificada de origem étnica, social e comunitária. Famílias estão inseridas em um corpo maior, uma cultura com padrões de organização, uma corporeidade, valores e formas de relações sociais. Há uma sobreposição de camadas no corpo da família que influencia os padrões de contato, as aspirações, expectativas e valores de seus membros. Neste contexto complexo e multidimensional, herdamos alguns padrões e aprendemos outros, ora por incorporação, ora por imitação, ou formando oposição e resistência. Crescemos no seio da família, corporificando um legado herdado, interagindo, e formando a nossa pessoalidade respondendo da melhor forma possível aos estímulos e desafios da convivência. Neste processo formamos uma estrutura anatômica-emocional, padrões de comportamento e atitudes próprias que configuram um modo de ser no mundo. À medida que crescemos e formamos a nossa identidade consolidamos papeis relacionais e sociais que posteriormente repetimos nas outras relações.
Neste workshop usaremos o esforço muscular cortical voluntario para diferenciar graus nos nossos papeis habituais, herdados ou formados na família, e criar alternativas para o viver.
Famílias têm padrões de organização próprios, um modo de funcionar envolvendo a regulação de proximidade e distancia, a intensidade de excitação, formas de contato e intimidade, colocação de limites, relações de cooperação ou competição, e encorajamento ou não ‘a individualidade e crescimento de seus membros. Mencionarei aqui uma variedade de formas familiares para te estimular a iniciar uma reflexão sobre a sua experiência em família e iniciar o seu trabalho.
Há dois divisores de águas que podemos usar como referencia quando trabalhamos com famílias: o grau de diferenciação e conexão dos seus membros e a formação ou não de adultos autônomos. O desenvolvimento de adultos requer o reconhecimento da singularidade dos seus membros, o atendimento de necessidades básicas e o respeito ‘as diferenças individuais — um ambiente firme-poroso que ofereça suporte e pertencimento, um corpo familiar estável, mas com elasticidade e
permeabilidade suficientes para permitir o ir e vir dos seus membros e a inclusão do novo. Uma família que ofereça contato, afeto, separatividade, calor, proteção, limites e contenção.
Famílias podem ser móteis, porosas, rígidas ou densas. Podem ser fusionais ou distantes. Permeáveis ou impermeáveis. Capazes de diferenciação e colocação de limites ou com bordas difusas e indiferenciadas. Esfuziantes ou reservadas. Intensamente calorosas ou frias. Ambientes onde tudo é possível e o céu é o limite, ou cheios de regras e com pouquíssima flexibilidade.
Famílias móteis, com pouca diferenciação entre seus membros dificultam o crescimento de adultos, todos funcionam como ‘’um corpo só’’, em bloco, sem distinção da individualidade de cada um e dos espaços pessoais. Famílias excessivamente porosas também carecem de fronteiras bem definidas, os limites e o suporte são fracos, não ha segurança suficiente para um desenvolvimento estável. Nas famílias rígidas com um padrão de distanciamento excessivo falta proximidade, calor, flexibilidade e acolhimento para o amadurecimento, o que também dificulta a formação de adultos. Famílias densas se fecham em si mesmas e não permitem trocas com o mundo externo, que é percebido com desconfiança e potencialmente ameaçador. Há uma firme divisão entre ‘’nos e eles’’ e uma demanda excessiva de lealdade que cerceia as interações com os ‘’de fora’’.
Há também famílias onde os pais são adultos subformados e os filhos precisam adultificar-se prematuramente e assumir responsabilidades maiores do que a sua capacidade naquele estagio da vida. Impossibilitados de amadurecer no seu tempo, permanecem internamente subformados, embora possam ter um desempenho social competente.
No outro extremo, há os pais super formados — muito rígidos ou densos, exigentes e com expectativas exageradas — dificultando também o amadurecimento dos filhos, que incorporam a exigência sentindo-se sempre ‘’aquém do que deveriam’’, ou com uma divida de desempenho para o outro, buscando sempre a aprovação alheia, em ambos os casos tornando-se adultos performáticos com um interior subformado.
Familias podem ter culturas de sucesso ou fracasso, de ambição e anseio de crescimento ou de auto sacrifício e impedimento, de expansão e satisfação ou de retraimento e insatisfação, de leveza e usufruto ou de esforço exagerado e frustração. Todos os padrões da cultura familiar são realidades corporificadas, posturas anatômicas e atitudes emocionais que incorporamos e repetimos no mundo. Corporificamos e
vivemos mitos familiares que afetam o nosso cotidiano e nossos caminhos futuros. Neste workshop usaremos micro movimentos muscular corticais voluntários para influenciar os padrões corporificados na família, formar mitos pessoais diferenciados e traçar caminhos próprios.
Convido você a investigar que padrões de comportamento e atitudes você herdou, incorporou, ou formou em resposta ‘a convivência familiar, como você os vive hoje e o que gostaria de formar na sua vida. Trabalharemos com o esforço muscular cortical voluntário para diferenciar padrões somatico-emocionais que corporificamos na família, e formarmos como queremos nos relacionar conosco e no mundo.
Como era o padrão das relações na sua família de origem?
Como era a cultura da sua família?
Padrões de contato? Calorosa e afetiva? Esfuziante? Fria e distante?
Quem era(m) o(s) adulto(s) responsável (s) na família?
Que papeis você assumiu?
Para quem?
Você e filha (o) do seu pai ou da sua mãe?
Que tipo de negociação você fez para pertencer?
Que papeis você aprendeu na família e pratica hoje nas suas relações?
Como você forma intimidade e proximidade? Ou evita forma-las?
O que você gostaria de formar nas suas relações?
De finalizar?
De desenvolver mais? De diminuir?
No trabalho formativo ‘‘… Aprendemos a formar graus de contato, permeabilidade e proximidade, modulando distância, limites e impermeabilidade. Aprendemos a formar intimidade conosco e com outros, a sair dos extremos da densidade impenetrável e da motilidade transbordante. Aprendemos a amaciar a dureza da rigidez e a firmar a gelatina da porosidade. Organizamos um modo pessoal de filtrar o que não desejamos e de acolher o que queremos. Experimentamos estilos diversos de nos aproximar e distanciar, de receber e evitar contato, de tocar e sermos tocadas. Principalmente aprendemos a multiplicar modos de estar presente nas relações, a variar formas de contato e ampliar possibilidades. Amadurecemos e modelamos novas formas de estarmos presentes, influenciando assim conhecidos padrões familiares de relacionamento.’’ Stanley Keleman, 2010
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